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OPUS DISSONUS




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O GOSTO COMO UM INIMIGO DA ARTE

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Existem três direções/temas necessários (e carentes de discussão) para a melhor compreensão do papel de um crítico e para o melhor entendimento da arte por parte do público, são elas:

1 - A CRÍTICA BASEADA NO GOSTO
2 - A FALTA DE CONHECIMENTO TEÓRICO DE BASE
3 - A GRAVAÇÃO COMO UM DIFUSOR DE UMA TRADIÇÃO ERRADA

                          A Crítica e o Gosto parecem ter nascido ao mesmo tempo, e, no entanto, poucos percebem que não existe uma ligação justa entre estas duas palavras. Obviamente os críticos e o público têm o direito de gostar ou não de uma obra de arte qualquer, independente de quem é o autor da mesma. Mas antes de tudo devemos lembrar-nos de certos pontos como:
                          Que conhecimento nós temos para analisar uma obra e considerá-la de qualidade? Quais são os meios que existem para se fazer a análise de uma obra? Qual a intenção do artista que a criou? Antes de sabermos responder estas perguntas qualquer crítica é inviável e inútil.
                          Certamente muitos já viram/ouviram “críticos” despreparados fazerem comentários como: “o pianista usou muito pedal”, e o interessante é que fazem esta crítica sem conhecer a partitura da obra em questão. Apenas para exemplificar, Franz Liszt possui um grande número de obras para piano onde ele indica a utilização de pedais de uma forma nada convencional (vide: Após Uma leitura de Dante, Sonata em si menor ou a Balada nº. 2), mas, devido talvez a um medo da crítica ou a uma falta de conhecimento generalizada, os intérpretes acabam interpretando estas obras seguindo uma tradição criada por maus músicos e gravadoras que, sem quaisquer escrúpulos, fazem um marketing enorme para tentar convencer a todos que aquele artista é um dos maiores de todos os tempos por estar fazendo tal interpretação.
                          O conhecimento da partitura é imprescindível para qualquer um que queira dizer que uma obra está bem ou mal interpretada, pois o fato de não gostarmos de uma obra não significa que ela está automaticamente sendo executada de forma errônea.
                          Para interpretar uma partitura não basta apenas saber ler, existem regras e técnicas que estão ligadas a época em que a obra foi composta e que precisam ser levadas em consideração por qualquer um que queira compreender e/ou interpretar a obra.
                          Beethoven talvez seja o compositor que possui o maior número de obras mal interpretadas através dos tempos. Uma breve análise do início da Grande Sonata Patética Op.13, apenas para exemplificar uma única obra, já nos mostra um erro absurdo que vem sendo cometido por TODOS intérpretes desta obra, desde os aclamados Horowitz, Arrau, Nat, Richter, Serkin, Brendel, até os estudantes e intérpretes da atualidade.

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                          Percebam que as notas vermelhas são melódicas e estão separadas das outras que pertencem às hastes dos acordes. Mas mesmo com as regras de grafia do período clássico e do início do período romântico sendo claras a respeito de como devemos observar e executar uma melodia e um acompanhamento (homofonia), todos os intérpretes seja por falta de leitura, estudo e/ou análise acabam lendo da mesma forma errada, fazendo com que as notas agudas dos acordes sejam consideradas a melodia da música.



                          O problema é que, não somente pela escrita, mas, historicamente, a obra de Beethoven demorou a ser aceita por não possuir a linguagem leve de Mozart. No entanto a melodia errada que é propagada nesta Sonata de Beethoven jamais seria considerada estranha ou pesada, pois trata-se de um conjunto de notas muito simples, por outro lado, a melodia correta é bem mais exótica e Beethoveniana, e, além disso, é ela que justifica através da teoria a construção dos outros dois movimentos da Sonata.



                          A falta de conhecimento gera ainda padrões tortos de beleza e de entendimento da obra alheia, como, por exemplo, as interpretações de Glenn Gould da obra de Johann Sebastian Bach. Sem dúvida vale a pena conhecer as gravações de Gould, mas trata-se do menos Bachiano dos intérpretes de Bach e nunca suas gravações deveriam ser utilizadas como referência para conhecer a obra de Bach e sim como “um outro caminho”, mas que não deve ser seguido por estudantes devido a sua esterilidade e falta de base.
                          Para piorar, os caminhos tortos da má interpretação levam o intérprete a níveis ridículos onde a palhaçada se torna a meta principal para poder segurar um público como faz, por exemplo, o pianista chinês Lang Lang, que nada faz além de tocar as notas das músicas que ele se propõe a “interpretar” da maneira mais errônea possível enquanto o mesmo faz caretas que parecem zombar do público e da obra que ele tenta executar, e sinceramente é uma pena ver alguém com tanta capacidade mecânica nas mãos não saber usar isso em nome da arte e virar um bobo-da-côrte para os pseudo-intelectuais que o assistem e veneram.
                          Mas, se por um lado existem os que fazem isso no palco, por outro existem aqueles que patrocinam este lixo. E aqui entram as gravadoras interessadas apenas no lucro. Obviamente não há mais um interesse no registro histórico por parte das mesmas, apenas há dinheiro para os que podem vender bem. E estes “lang-langs” deprimentes vendem bem.
                          Fosse apenas este o problema, tudo bem, mas este monte de erro acumulado é divulgado como “o correto” entre estudantes de conservatórios e de universidades. O fato é que as pessoas não escutam mais os grandes pianistas, pois eles têm pouco espaço, escutam sim muitos farsantes que ganham contratos com gravadoras através de grandes concursos (duvidosos) internacionais e que fazem nada mais do que ocupar o espaço de quem realmente faz a diferença.
                          Infelizmente Leo Sirota, Frederic Lamond, Mark Hambourg, Ignaz Friedman nem são mais lembrados, e de grandes pianistas hoje podemos apenas citar Marc André Hamelin, Konstantin Scherbakov, Piers Lane, Sandro Russo, Francesco Libetta, e já é difícil continuar tal lista sem pensar muito uma vez que eles estão a mercê deste sistema corrompido e podre.
                          A crítica e os críticos já estão no campo da inutilidade histórica há muito tempo, pois estes formadores de opinião necessariamente deveriam possuir conhecimento sobre a área que comentam, e isso já quase não acontece mais. Se por um lado a internet abre espaço para a pesquisa e troca de informações, por outro ela também serve para megalomaníacos escreverem absurdos na tentativa de adquirirem fiéis cegos. Pseudo-Schumanns, Pseudo-Wagners? Talvez sim, mas seria tão menos incômodo se pelo menos eles soubessem fazer uma obrinha musical qualquer...

Artur Cimirro
28 de setembro de 2010

(*) imagens extraídas da primeira edição da Grande Sonata Patética Op.13 - 1799 - cópia cedida pela Beethoven-Haus Bonn / Alemanha
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