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De Menor (revisão)
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O desenvolvimento físico e intelectual da criança, já há algum tempo, tem gerado divergências entre as várias áreas que compõem as ciências humanas. As de psicologia e biologia divergem em seus percentuais quando se trata de justificar o comportamento do ser humano. Para a biologia o comportamento do ser humano diante da sociedade é ditado em grande parte por sua carga genética, ficando a menor parte por conta do “meio” em que vive. Na área psicologia do desenvolvimento não existe um consenso quanto a esse percentual, não querendo dizer com isso, que estudos mais aprofundados não estejam sendo realizados por vários pesquisadores da ciência da psicologia.

Um impasse sobre as diversas teorias existentes faz com que percamos tempo em demasia na escolha de “técnicas apropriadas” para se educar e formar um cidadão.

Focar as diferenças etárias existentes, para uma maior e melhor compreensão do ser humano quer seja na área biológica, ou na psicológica, deixo para àqueles que se propuseram e têm formação para tal. Mesmo porque, no meio acadêmico há ainda muita especulação sobre as diferentes fases do crescimento humano, sem contar que grande parte do que se sabe a respeito, é obtido através de bibliografias estrangeiras, que em muitos casos não refletem a nossa realidade, culturalmente falando.

Nesse aspecto, cria-se uma polêmica com tons ambivalentes, tornando muitos conceitos extremistas, quando se fala do ser em desenvolvimento. Fatores biológicos e sociais são fartamente explorados, porém quero me deter apenas naqueles que me levam a imaginar se alguns conceitos não estão equivocados.

Alguns exemplos de meio corrompido e/ou alienado, cito em forma de “historinhas verdadeiras” para uma melhor compreensão e reflexão por parte dos leitores:

1. Numa ocasião, pude presenciar crianças atirando pequenas pedras e pedaços de madeira, em uma viatura policial que estava fazendo seu trabalho de ronda pela cidade. A viatura foi estacionada e o policial, com ar de quem já estava acostumado com essas “brincadeirinhas” perguntou-lhes por que faziam aquilo. A resposta, apesar de incoerente foi incisiva e desafiadora: “nóis é de menor e se relá a mão, nóis vai lá no Conselho Tutelar” (sic). O policial foi embora cabisbaixo sob as risadas cínicas dos gozadores “inocentes”.

2. Através de alguns professores da rede pública (ensino fundamental e médio), fiquei sabendo que muitos de seus alunos atiravam-lhes bolas de papel, laranjas podres, rasgavam e rabiscavam suas cadernetas de pontuação, e ofendiam-lhes com palavras de baixo calão. Outros ainda, que escolhiam ficar fora da sala de aula, jogavam pedras nas janelas, quebrando vidros, atingindo colegas e professores, e quando convocados pela Diretoria da Escola, respondiam que eram “de menor” (sic) e que se houvesse alguma represália, seus pais iriam denunciar no Conselho Tutelar.

Tantas outras “traquinagens” são feitas, com a alegação “sou de menor”, que se eu tentasse enumerar aqui, não teria espaço para tanto.

Então eu pergunto: eles não sabem o que fazem, têm problemas psicológicos e/ou fisiológicos, sentem-se protegidos por leis demagógicas, não têm educação de base, ou é uma somatória de tudo isso?

Crianças que jogam casca de banana no chão, que espalham uma jaca inteira no centro de uma cidade, para se deliciarem com um transeunte escorregando e se machucando na sujeira feita, sem que ao menos se escondam, tamanha a certeza da impunidade, podemos taxar essas ações, como sendo o quê?

Aquelas que picham muros, que jogam seus lixos nas ruas, que depredam bens comuns, que roubam, e que afrontam cinicamente a lei básica que deve existir entre os seres, que é a de respeitar para ser respeitado, esperam ainda o quê do cidadão de bem?

Se solicitássemos a todas as pessoas que compõem os vários segmentos existentes em nossa sociedade, que nos trouxessem histórias bizarras envolvendo nossos “anjinhos”, ficaríamos espantados com o número, gênero e grau das mesmas. E tudo por conta do tal “sou de menor”.

O número de educadores (pais ou tutores) que não está preocupado com a boa formação de sua prole é assustadoramente grande, sendo encontrado em todas as camadas sociais.

Um programa de revisão dos valores sociais para esses pseudo-educadores, já deveria ter tido seu começo há muito tempo, porém não creio que as chamadas “classes ricas” e as “intelectualizadas” participassem desse programa. Primeiro porque acreditam que seus filhos são intocáveis, e depois, a arrogância típica causada pelo sentimento de sapiência que os envolvem, é muito grande.

O que dizer então daqueles que vivem no sofrimento da miséria, cujas necessidades básicas falam bem mais alto, abstraindo-lhes qualquer raciocínio lógico imposto pelo meio em que vivem?

Urge providências no sentido de reavaliar valores, do contrário, estaremos fadados a conviver com a insanidade daqueles que acreditam que o mundo é só deles.

Aos adeptos de Piaget (educador francês), vai aqui um alerta: ele parte do princípio que métodos construtivistas, são excelentes formadores de cidadãos, e sem sombra de dúvida, ele tem razão. Acontece, que esse conceito lógico e excelente, foi embasado numa educação européia e milenar que tem como princípio-base, a indiscutível “educação de berço”. Para nós, país novo e em desenvolvimento, onde o sistema apenas engatinha, a adoção nas escolas da “cartilha” de Piaget, é no mínimo um equívoco.

Aos educadores que não souberam interpretar e adaptar Piaget ao sistema de ensino brasileiro, eu gostaria de arriscar um conselho: Piaget? Só se for com uma pitada de Pinochet!

Nicete Campos
4/6/2007


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