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Quando a vida prega peças
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Quem nunca apostou, serviu de escada ou se anulou por uma pessoa, para depois constatar o quanto não valeu a pena?

Apesar do ser humano viver se desencantando um com o outro, ele insiste misteriosamente em relacionar-se de maneira afetiva, criando um clima de co-dependência em que, muitas vezes, a amargura, o desencanto e a aridez de ideais, acabam por flexioná-lo em demasia levando-o inclusive à depressão.

Ah! Se não existissem espelhos!

Espelhos de almas ingratas e idiotizadas, carregadas de preconceitos, luxúrias, prepotências e egocentrismos. Espelhos trincados, embaçados, distorcidos e quebrados.

No afã de recompor-se dignamente, aquele que foi usado e abusado, se debate freneticamente atingindo aleatoriamente outros seres que dele se aproximam. Fera ferida e desajeitada destrói espelhos alheios, investe no outro todo o rancor, toda a humilhação sofrida, graças à sua ingenuidade e ausência de amor-próprio.

O que queremos enxergar no outro que não conseguimos enxergar em nós mesmos? Por que cargas d’água insistimos em nos pregar peças, atraindo para perto de nós os fantasmas, irmãos daqueles que estão escondidos no recôndito do nosso ser?

O interessante disso tudo, é que vamos levando a vida sem querer saber dos nossos pontos obscuros. No entanto, assim que os vislumbramos no outro, mesmo que seja apenas por um instante, queremos de imediato manter contato com eles.

Então deliberadamente gostamos de servir de escada para o outro? Ficamos bem quando o outro consegue nos afundar e até anular? Que briga é essa de forças “ocultas”?

Literaturas, filmes, peças teatrais e estudiosos da mente humana se proliferam na tentativa de desvendarem o cérebro humano. No entanto, os fantasmas se escondem e continuam a agir.

O que fazer? Ficar só e voltar-se para seu próprio umbigo?

Essa me parece uma solução drástica, porém, para os parasitas cerebrais, estar nessa condição, é apenas uma questão de esperteza.

Bom proveito aos que se parecem com os corvos, que ficam do alto dos seus postos observando a destruição da carne alheia, para em seguida avançarem sobre seus miolos.

Minha única esperança é que um dia eles possam morrer de indigestão.



Nicete Campos
13/5/2004


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